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Novo hospital do Oeste: Indecisão do Governo é balde de água fria

Foi publicado no Diário da República no último dia de julho, o texto final da resolução aprovada na Assembleia da República que recomenda ao Governo a construção nesta legislatura de um novo hospital público para o Oeste, localizado no Bombarral e a readaptação dos Hospitais de Peniche, Torres Vedras e Caldas da Rainha para serviços de proximidade. Um texto que reuniu as propostas do Bloco de Esquerda, PCP, Livre, PAN e de um grupo de cidadãos e que teve também o voto favorável do PS. Chega, IL e AD abstiveram-se.

Ao mesmo tempo chumbaram as moções da IL que defendia uma parceria com privados e outra de cidadãos das Caldas que queria a localização naquele concelho.

Continua a teimosia ideológica de querer gestão privada, em detrimento de um Hospital Público de todos nós, com o objetivo apenas de prestar um serviço de qualidade e não de buscar o lucro. Não se entende como Portugal perdeu 14 hospitais públicos e ganhou 29 privados, desde 2010, ano anterior à troika, mesmo depois com governos do PS.

Já chega de iniciativa privada na saúde do Oeste, onde abundam respostas muito rentáveis para alguns grupos, mas que depois na prática levam cidadãos a desesperar quando percebem que os seguros não cobrem muita da assistência que necessitam, ou de repente uma consulta custa mais do dobro de há uns anos, sem falar nos preços de internamentos, diagnósticos e tratamentos. Cerca de metade do orçamento da saúde já vai para privados, em vez de fortalecer o investimento no público. Recorde-se a pandemia, quando batemos com o nariz na porta dessas unidades e foi o nosso Hospital público que nos salvou a vida, mesmo sem serviços essenciais como uma unidade de cuidados intensivos.

No debate das propostas de resolução em maio de 2024, ouvimos o discurso do deputado do PSD, antigo bastonário da ordem dos médicos, justificar a abstenção com a necessidade de verificar a proposta anterior e a viabilidade dos terrenos, garantindo que o Governo iria tomar uma decisão muito em breve. Isto não nos tranquiliza. Ficaram em aberto a localização, eventuais novos estudos e o modelo de financiamento e de gestão, ou seja, um limbo.

Inclusivamente o mesmo Miguel Guimarães, enquanto bastonário, visitou o Hospital de Torres em maio de 2018 e defendeu a necessidade premente de construção de uma nova unidade hospitalar que resolvesse os problemas de saúde pública na região, em diálogo com as autarquias, elencando uma série de problemas sentidos no atual modelo do CHO, como a falta de médicos e de serviços.

Recuos que custam caro à nossa saúde

Após mais de uma década de desentendimento e negociação entre as autarquias do Oeste, foi finalmente terminado um estudo técnico que sustentou a escolha por Bombarral. Em junho de 2023 o então Ministro da Saúde Manuel Pizarro, anunciava a escolha pelo Bombarral, bem como a tipologia da estrutura.

O PS tinha finalmente assumido que se iniciasse o projeto da obra, estando essa intenção inscrita nas propostas para o Orçamento de 2024 e incluída na pasta de transição para o novo Governo. Com o PSD essa recomendação não foi colhida e, pelos vistos há indecisão.

Com a discussão do Orçamento de 2025 à porta ficaremos a saber se há ou não vontade de avançar, mas a pergunta que fazemos é: porque adiou o PSD uma decisão já tomada com estudos técnicos credíveis e já inscrita na proposta de OE para 2024?

Ao fim de 36 anos a governar as Caldas, o PSD perdeu em 2021 para um independente, que saiu do próprio partido, criando divisões quanto ao novo Hospital. A defesa da localização nas Caldas passou a ser uma bandeira deste novo executivo, pelo que será fácil adivinhar o que acontecerá ao PSD nas Caldas daqui a um ano, nas eleições autárquicas, se concordar com a localização do Bombarral.

Veja-se a posição dos deputados caldenses, que defendem a localização em Caldas. Veja-se as lutas e desacordos entre as concelhias do Bombarral (a favor), a das Caldas, a de Óbidos (contra). Por outro lado, o PSD de Torres ainda fala na opção em Campelos, Torres Vedras e quer estudar melhor esta hipótese.

Temo que as divisões e a proximidade de eleições locais possam estar a matar a decisão anteriormente tomada e a prejudicar as populações. Estas guerras põem em causa uma solução tecnicamente sustentada e politicamente maioritária, após tantos anos de desacertos e voltar a criar o caos.

Após o tormento que passamos com as urgências este Verão e a falta de serviços fundamentais, a obra tem de avançar num local central e de acordo com critérios técnicos, não só para tratar com dignidade a população como para fixar médicos que tanta falta fazem.

Não podemos continuar a tolerar que interesses difusos se sobreponham à saúde pública de uma região de 300 mil utentes, deixada ao abandono por décadas.