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Runa entregue à sua sorte no caso da localização da Subestação Elétrica

A modernização e eletrificação da linha do Oeste é uma obra inestimável, mas o progresso não se faz a qualquer preço. A localização da Subestação de tração na zona de Runa e Penedo, está a gerar protestos, sendo legítimo questionar se o estudo de uma alternativa, não será a melhor solução e se a questão está a ser tratada corretamente pela autarquia.
Após período de discussão, a Infraestruturas de Portugal, IP, manteve a mesma localização do estudo prévio, alegando estarem acautelados os impactes para a população em termos de localização da estrutura e da passagem das linhas de alta tensão. A localização é apresentada como inevitável.
Mas a verdade é que não foram consideradas soluções alternativas. Nem as apresentadas em sede de discussão pública, nem as que foram solicitadas pela própria Agência Portuguesa do Ambiente, APA, que a IP ignorou, levando depois um “puxão de orelhas” da Comissão de Avaliação Fina, CAF, por não o ter feito, conforme registo demolidor na página 17 do relatório da CAF de 2019.
Quanto ao argumento de afastar a estrutura de zona de cheia, basta verificar a olho nu que a estrutura fica contígua ao rio, para além disso na mesma cota, do outro lado do rio há locais muito mais seguros e sem o impacte deste. O próprio Estudo de Impacte Ambiental, EIA, chama a atenção no Volume 0, página 99, para a REN e zona ameaçada por cheias. O mapa de zona de cheia específico pedido pela Agência do Ambiente, não contempla Runa, o que é inacreditável (p. 23, Tomo 4 do EIA, Aditamento1).
Muito menos há a consideração dos elementos em termos ambientais, paisagísticos, patrimoniais ou arqueológicos. Nem a autarquia os refere em sede de consulta pública, onde apresentou uma pobre argumentação, mas deveria ter em conta que a Câmara tem competências legais e responsabilidades na proteção do património cultural, paisagístico e ambiental do concelho. Os serviços especializados da autarquia deveriam ter sido envolvidos na argumentação das diversas dimensões, nomeadamente, em relação também ao PDM por exemplo, dado estarmos a falar de zona com Reserva Ecológica e Reserva Agrícola.
Os impactes paisagísticos muito significativos até estão assinalados na página 50 do Volume 0 do próprio Estudo de Impacte Ambiental e são claros. São também confirmados de forma veemente na página cinco do parecer final da Comissão de Acompanhamento Final, CAF, especialmente a partir de Runa.
Nos argumentos da IP destaca-se a vantagem dos acessos ali existentes e é aqui que parece ser a mais valia do local. Usando vias centrais de Runa e Penedo, estão resolvidas as estradas de acesso à Subestação, com vantagem económica. Mas a realidade é que a obra será praticamente dentro de Runa e ninguém se preocupou sobre o fato da localidade vir a ser atravessada diariamente por camiões, com todos os impactes em termos de ruído, de poluição, de incómodo. Não só pela obra, mas pela dimensão dos veículos que serão necessários para deslocar postes enormes a entrarem pela aldeia adentro. Estes impactes considerados muito significativos, são também descritos pela CAF na página 3.
ALTA TENSÃO E SAÚDE PÙBLICA
Em relação à saúde pública, dada a inexistência de conclusões científicas claras, ou de estudos epidemiológicos extensivos e independentes, as evidências apontam para um risco baixo, sendo, no entanto, aconselhável uma distância preventiva das habitações ou outras estruturas sensíveis, relativamente a Alta ou Muito Alta Tensão, entre 50 a 100 metros, de acordo com Azevedo, B. 2010, da Universidade do Minho. A própria lei aponta os 45 metros de distanciamento de linhas de alta tensão a habitações (n.º 1 do artigo 7º do Decreto-Lei 11/2018; e n.º 2 do artigo 28 do Decreto Regulamentar 1/92).
O risco para a saúde em termos de doença ou stress devido à exposição às radiações, não é um assunto fechado, mas existe aquilo que a OMS define como risco percecionado pelas populações, que convém prevenir com diálogo, normas claras e afastamento, que não coloquem as pessoas numa situação de insegurança e medo.
Só que, neste caso o afastamento da Subestação é de 10 metros às casas do outro lado da estrada e menos de 100 metros de Runa. Trata-se de uma zona de crescimento urbano entalada entre Runa e Penedo.
PATRIMÓNIO, AMBIENTE E PAISAGEM
A Subestação fica ao lado de uma povoação sede de freguesia e está prevista para perto do Penedo, bem como linhas de alta tensão, que farão sentir impactes muito significativos na Quinta da Casaboa e envolvente, dado e elevado valor paisagístico, somando os enormes impactes visuais de postes com mais de 40 metros de altura e componentes associados.
Runa tem um centro urbano antigo com um considerável número de edifícios de valor patrimonial relevante como o Asilo dos Inválidos Militares, a Estação da CP e um conjunto de habitações referidas no projeto das Áreas de Reabilitação Urbana da autarquia, bem como Penedo onde se conhecem vestígios arqueológicos que remontam aos romanos e até ao calcolítico. Dois aglomerados a necessitar de medidas de salvaguarda e reabilitação, atração de novos habitantes e de melhorar a qualidade arquitetónica, paisagística, ambiental e funcional. São ainda valiosos e a proteger pelo PDM, os moinhos de Carrasqueira, Mascote, Penedo e Caixaria em torno de Penedo, bem como as famosas Quintas das Pederneiras, Casa Boa, Granja e Cascavelos.
Na zona do Penedo o PDM em vigor até 2017 elencava património arqueológico de elevado valor a proteger como Povoado Fortificado Calcolítico de Penedo e a Villa (quinta) romana do Penedo, de onde se recolheram inúmeros achados de relevância para a arqueologia local e nacional, a cerca de 100 metros em relação à Subestação e seus terrenos próximos. Um património arqueológico sobejamente conhecido, que aparece referido apenas num dos inventários do estudo da obra, mas que não é valorizado na escolha do local.
É também naquele local que muito provavelmente existiu uma estrada romana de acesso ao Penedo, localidade de origem comprovadamente romana. A IP não levou a cabo estudos para verificar a eventual presença destes vestígios numa zona que será, definitivamente, afetada pela subestação, nem que fosse para eliminar a possibilidade dessa existência. Dado a quantidade de achados arqueológicos na zona em causa, não será de estranhar que a movimentação de terras em zona arqueológica possa constituir um problema. Agora a IP veio destacar arqueólogos para acompanhar as obras, como se fosse inevitável esta infeliz localização, que nos aparece como fato consumado.
Acresce que a Subestação fica encostada ao Sizandro e à azenha com represa, um local de valor patrimonial, ambiental e paisagístico. Uma zona do Sizandro ideal para lazer e criação de fauna piscícola que tão arredada tem andada do rio.
PROTEGER O DESENVOLVIMENTO FUTURO DE RUNA E SUAS POPULAÇÕES
Por todas estas razões deve haver especial cuidado e sensibilidade ao usar os territórios mais desertificados do concelho, já de si fragilizados nesta dicotomia litoral e interior, para implantar este tipo de equipamento, que seguramente um grande centro urbano repudiaria.
As populações foram ignoradas, mas têm o direito de ser ouvidas. O processo de consulta pública deveria ter tido momentos de contato direto com as populações que, convenientemente não aconteceram. Runa tem o legítimo receio de toda esta estrutura causar impactos até na sua desertificação e no afastamento de possíveis novos residentes, contribuindo para o seu declínio, dado que o património se revela o seu maior seguro de vida.
Estruturas deste tipo, com linhas de alta tensão associadas e respetivos impactes amplamente referidos, são fatores dissuasores de uma atratividade que, de outra forma poderia ser o motor do desenvolvimento da zona, dada ser um conjunto de uma enorme riqueza patrimonial e paisagística.
A possibilidade de uma passagem superior e de um apeadeiro junto à aldeia, deveriam ser implementados, o que, a par do parque verde com zona para autocaravanas, são peças chave de desenvolvimento. O turismo de património e ambiental, os percursos e as visitas, são agora postos em causa. Ninguém quer morar perto deste tipo de estruturas, nenhuma beleza resiste e nenhum visitante se interessa por uma paisagem dessas.
O Projeto coloca as populações em segundo lugar, dando prioridade a outros fatores, sem que tenha havido uma real auscultação dos habitantes de Runa e Penedo, que foram confrontadas com um fato consumado. Não se devem colocar fatores económicos à frente das pessoas.
Urge uma posição pública forte da autarquia nesta matéria, mas em vez disso a população de Runa parece votada à sua sorte.