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Propostas sociais chumbadas no vale tudo para manter o poder

As consequências da pandemia estão para ficar. Os números falam por si e Torres Vedras não é exceção. Para além dos aspetos sanitários há preocupações económicas, como o desemprego, risco de falências e dificuldades de tesouraria, com a incerteza sobre a possibilidade de alguma recuperação. Os próximos meses são importantes para as pequenas empresas e seus trabalhadores com o desemprego com mais 17,3% do mesmo período no ano passado, especialmente na restauração. Com o fim do layoff, vão começar a ser despedidos mais trabalhadores.

No sentido de contribuir para o apoio à pequena economia do concelho, o Bloco de Esquerda consultou pequenos comerciantes e a associação representativa do setor, tendo verificado as dificuldades vividas, que justificariam da parte da autarquia uma ação mais musculada de apoio. Soubemos que a informação dos apoios da autarquia não chegou ao conhecimento do terreno, que os apoios da autarquia foram manifestamente insuficientes e que os apoios governamentais não abrangeram pequenos negócios.

Nesse sentido foram apresentadas pelo Bloco de Esquerda um conjunto de sugestões ao executivo camarário para um apoio mais efetivo e prolongado até ao final do ano, naquilo que a Câmara pode fazer dentro das suas competências. Destacam-se as propostas de suspensão total do pagamento de rendas em espaços municipais e taxas municipais para as pequenas empresas torrienses, bem como a suspensão das tarifas fixas da fatura da água, tudo isto até ao final de 2020, entre outras que constam do Plano apresentado.

Crentes da pertinência das recomendações, ficou a perplexidade do chumbo liminar do PS. Todas as restantes forças políticas apoiaram as propostas exceto o PS. O mais estranho foi o fundamento utilizado. De acordo com os socialistas estas medidas seriam de aprovar se tivessem sido feitas no início da pandemia em março, acrescentando ainda que ao dia de hoje não faz sentido. Argumentou ainda que são medidas já em execução.

Na política não vale tudo e compreende-se que o PS se sinta incomodado com a pertinência do tema e com o Bloco, mas é necessário falar verdade. Em primeiro lugar nenhuma das medidas propostas se encontram em execução e as duas que visaram redução de taxas e que constam no plano da autarquia ficaram-se pelos 30% de redução. Segundo, todas as medidas extraordinárias de emergência autárquicas, mesmo insuficientes e mesmo sem impacto no terreno, terminam em 30 de junho. O PS não quis considerar prolongar o tempo, nem acolher novas ideias, apresentando uma justificação no mínimo, estranha.

Mais estranha é a afirmação de que, de acordo com os argumentos do Deputado Municipal João Aniceto (PS), a quem coube dar a cara pela posição do PS, se tivesse sido em março já era pertinente. A fazer fé no PS, a pandemia e a crise económica não existem mais, pelo que não há razão para repensar medidas e prolongar prazos. Se era preciso chumbar a proposta, teria sido mais respeitoso para os torrienses uma argumentação dentro da verdade e menos displicente.

A mesma sorte tiveram as restantes propostas do Bloco, nomeadamente um Plano para a educação em tempo de pandemia a prever o início das aulas e campanha de sensibilização das para as condições de trabalho e regras de segurança nas campanhas agrícolas que se avizinham da fruta e vindima. Sobre educação a autarquia não tem nada pensado, apesar das suas responsabilidades em Educação, mas mesmo assim o partido que a sustenta acha que não é preciso pensar agora nisso atempadamente. Sobre o reforço de informação para as campanhas agrícolas, o PS acha que já há muita informação sobre segurança, embora não se saiba onde, dado que no site da autarquia não se encontram. Surpreendeu-nos o argumento de que a informação é muita, mas o problema serão os comportamentos dos cidadãos, que a autarquia não controla. Se algo correr mal ficámos a saber de quem será a culpa.

Portanto valeu o princípio socialista que vai tudo bem, a autarquia está a fazer, mesmo quando não faz, os comerciantes, os trabalhadores e os cidadãos em geral nem merecem o acolhimento e a discussão de ideias, nem que seja sob uma perspetiva humanista.

Por último, e não menos caricato, foi o Bloco acusado pelo Deputado Municipal António Carneiro, de estar a “fazer politica”, como se isso significasse que as intenções das propostas fariam parte de alguma “agenda oculta” e que fazer política será algo negativo. Pois o que fazem, os e os autarcas, senão política, incluindo todos os Deputados Municipais?

No entanto, na política há prioridades, uns escolhem contribuir com propostas e debate de ideias para ir ao encontro de necessidades e problemas concretos vividos pelos torrienses; outros sentem-se incomodados e escolhem abater qualquer ideia que possa por em causa a manutenção do poder pelo poder, mesmo que isso signifique entrar pelo campo do surrealismo argumentativo.