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DISCURSO DO BLOCO NA SESSÃO SOLENE DO 25 DE ABRIL

Decorreu no dia 25 de abril de 2021, a sessão Solene da Assembleia Municipal sobre o dia da revolução de abril.

O discurso do Bloco de Esquerda foi apresentado por João Rodrigues, o deputado municipal eleito pelo BE.

O texto integral do discurso, encontra-se abaixo:

 

Hoje, que se comemora 47 anos do dia em que Portugal acabou com a ditadura, torna-se mais urgente que nunca lembrar o dia e o feito!

Estamos melhor que há 50 anos?

Não há dúvida de que estamos!

A ditadura, que se começou a desmoronar com a morte de Salazar e que teve o seu fim, ali mesmo, em Lisboa, no Quartel do Carmo, foi o princípio do fim de um país cinzento e miserável e de uma guerra colonial sangrenta, vil e que se sabia perdida.

Foi o fim da sombra negra que se abateu sobre o país, durante cerca de meio século, 

Os mais jovens, os que nasceram e sempre viveram a liberdade, felizmente nunca conheceram outra realidade, que não aquela onde podem livremente exprimir os seus pensamentos, onde se podem associar para a defesa das mais diversas causas e lutas, onde podem participar e discutir publicamente ideais políticos diferentes, até antagônicos, onde o preconceito e a exclusão não são normalizados;

Onde, melhor ou pior, sempre podem sonhar, podem e devem beber da história, o período negro dos seus antepassados que viveram metade do Sec XX em ditadura num país cinzento, com uma população iletrada, faminta de saber e de estômago, 

47 anos se passaram!

Após o 25 de Abril de 1974, nasceu o Serviço Nacional de Saúde, sobre um mote: O de todas e todos terem direito a cuidados de saúde, independentemente da sua capacidade económica, do seu nível social, do local onde vivem, de estarem presos ou em liberdade.

Em consequência direta disso, a mortalidade infantil diminuiu drasticamente.

Deixou de ser comum, uma família de 3 ou 4 irmãos, perder 1 ou 2 antes mesmo que atingisse a puberdade.

Criou-se a escola pública e  o nível de analfabetitização desceu acentuadamente.

Mas mais se fez:

Criou-se legislação laboral! Os trabalhadores passaram a ter direito a férias, a um salário mínimo, a 14 vencimentos por ano!

Protegeram-se os operários contra os despedimentos abusivos.

Nasceram vários partidos políticos e as pessoas passaram a poder criticar publicamente os governos e os políticos em geral e, imagine-se, passou a haver liberdade, até para se defender ideais, como os que quase escravizaram os Portugueses nos 50 anos anteriores.

Ninguém mais podia ser torturado quando era detido e mesmo até, após ser considerado culpado do mais vil dos crimes. 

A vida humana passou a ser considerada por toda a sociedade, como inviolável.
 

As polícias e os tribunais, são independentes da política e um e outro não se podem imiscuir fora dos seus círculos de atuação. Terminou a polícia de defesa do Estado, que dava pelo nome de PIDE e mais tarde DGS.

Se estamos descontentes com o rumo do país, podemos intervir na sociedade a tempo inteiro, protestar, manifestarmo-nos e, podemos mudar tudo, com o nosso voto de 4 em 4 anos.

O País foi estratificado em poderes políticos distintos e que são, constitucionalmente, realmente distintos se assim o quisermos! O Legislativo, o Presidencial, e o Autárquico!

Podemos, através do voto, contribuir para organizar estes poderes como bem o entendermos e por isso sim, agora, o poder é do povo!

Passados que estão, 47 anos desse glorioso dia para os portugueses, importa mais do que nunca o lembrar. 

Lembrar todos os dias e, todos os dias, nunca esquecer, o que foi o dia anterior a esse!

A Democracia, mais ou menos desenvolvida em que atualmente vivemos, não é um regime perfeito!

Não é perfeito porque em nome da liberdade de expressão, de associação, de participação coletiva, também permite o crescimento de movimentos que visam a sua destruição.

E eles andam aí, no Mundo, na Europa, em Portugal.

Estão em crescendo, movimentos populistas que bebem do crescimento dos descontentes. E bebem avidamente, dos descontentes de tudo e mais alguma coisa, criando ambientes emocionais de fácil adesão.

Os movimentos progressistas e democráticos são espinhos cravados nas suas agendas obscuras e inconfessáveis, por isso se valem da manipulação, da mentira, da fabricação de realidades paralelas e promessas de quimeras imaginárias. Não lhes interessa a democracia, a justiça social e económica, os direitos humanos, a liberdade de expressão, nem o conhecimento.  

Se nos distrairmos o suficiente, poderemos ver chegar ao poder, por via do voto democrático, novas ditaduras, ou regimes opressivos das liberdades e dos direitos por quem tantos dos nossos antepassados lutaram, foram presos, torturados e assassinados.

O regime democrático em que vivemos é permissivo a abusos e alguns dele se aproveitam para tirarem dividendos pessoais, usando o poder para traficar influências e mais tarde conseguirem fins de carreira confortáveis em grandes grupos empresariais e contas bancárias chorudas.

Tudo isto, tem causado um descrédito crescente na população, tomando todas e todos os políticos por igual.

No pós 25 de Abril e até hoje, nem todas e todos os políticos têm exercido os seus cargos com a devida dignidade, mas nem todas e todos os políticos são indignos e menos sérios.

Importa não desistir da democracia e votar! Votar massivamente no diferente quando achamos que as coisas deveriam ser diferentes.

Não desistir nunca de participar civicamente na permanente construção democrática.

A nossa democracia está aí, mas agora, mais em perigo do que nunca!

Poucos anos após o 25 de Abril, em nome do desenvolvimento económico, o Estado devolveu a muitas das grandes famílias os bens e o poder económico que lhes tinha sido retirado pelo povo, na revolução, voltando a ser donas do poder económico do país, mesmo sabendo-se que sempre comeram e deram de comer a Salazar e detinham o monopólio dos sectores agrícolas e industriais, perante a miséria de uma imensa maioria de explorados.

Na sequência da devolução do poder financeiro aos, desde sempre, “donos disto tudo”, o Estado foi-se vendo expropriado de grandes empresas estratégicas e essenciais, que contribuíam para os seus cofres, como os CTT, a GALP, a EDP, a Portugal Telecom.

O neoliberalismo, que virou moda no mundo ocidental, mas que não é mais do que o poder financeiro a impor-se  ao político e ao dos povos, tudo destruiu, no que diz respeito às formas de financiamento do Estado.

Como se nada disto fosse suficiente, o próprio Serviço Nacional de Saúde, sofreu um forte rombo, numa tentativa ideologicamente motivada por Governos de direita, a que não é alheio o PS, de privatização, onde os atores de sempre, grandes senhores de grandes famílias, o transformariam num simples negócio.

E agora, num passado mais recente, tenta-se culpar tudo e todos, menos os que, realmente são culpados, das sucessivas crises dos últimos anos.

Também ao nível da política local, o sistema sofre ameaças, as recentes alterações à Lei Eleitoral Autárquica num arranjo político entre PS e PSD, e que agora se tenta reverter, são uma tentativa de bipolarização do poder local, dificultando a participação de pequenos partidos e movimentos sociais nas eleições e, com isso, viciando o jogo democrático a favor das forças políticas de maior dimensão. Isto, por si só, é um atentado aos valores de Abril!

Atira-se areia para os olhos do povo, como sempre, culpando-se os migrantes pela falta de emprego, pela falta de segurança, bem como as comunidades minoritárias e as religiões. Cria-se um falso inimigo, fraco, vulnerável, para ocultar os verdadeiros interesses, que estão na origem dos problemas estruturais do país.

Aparecem grupos com soluções supostamente fáceis que, em nome da obtenção de apoio popular, defendem tudo e o seu contrário, vão para palanques gritar vergonha, acerca de tudo e mais alguma coisa, exceto de quem beneficia da exploração e da desigualdade e o povo é tentado pela facilidade emocional da manipulação.

O povo não vê que quem tem o palco para esses protestos ricos em emoção, mas vazios de soluções de fundo, esses protestos ao sabor dos ventos, é quem, no fundo, fez carreira aproveitando-se desses mesmos ventos que agora critica.

Estamos em perigo. A democracia está em perigo. Ela está a ser usada para a sua própria destruição.

Já se normalizou Salazar e o regime da ditadura, figura que muitos defendem por ter endireitado financeiramente o país.

Até grandes partidos, tendem a normalizar os que chegam carregados de ódio, associando-se a estes em atos eleitorais e, com isso, normalizando os seus discursos, ato só explicável por uma cega e insaciável sede de poder a qualquer preço.

O que esses não referem, porque não lhes convém ou nem sabem, é o preço que o país pagou.

Os cofres estavam cheios porque não havia proteção social, porque não se investia em infraestruturas, porque só ia ao médico quem tinha posses para lhe pagar.

Os cofres estavam cheios porque não se gastava dinheiro, porque no vasto interior rural, todos passavam fome exceto os grandes proprietários e porque as colónias nos enchiam de tudo ao preço da tirania imposta a povos, pelas armas, conquistados.

Não! Salazar não era bom, nem o que representava pode ser normalizado!

Nem ele, nem ninguém que hoje o defenda, o admire ou advogue no todo, ou em parte, as suas políticas!

Estamos a construir um país que rompe com o passado e não uma repetição patética de um antigamente que não foi glorioso, como nos querem fazer crer, nem foi justo, nem foi livre, para a grande maioria dos portugueses.

Mais do que uma data, ou comemoração, o 25 de abril representa um conjunto de valores, que devem prevalecer num regime democrático e cuja defesa se mantém atual. 

Não podemos baixar os braços nesta construção de uma sociedade com justiça social e económica, com igualdade no acesso, com direitos, com uma imprensa livre, de um país onde cada cidadão vale o mesmo e onde não abdicamos dos valores essenciais da democracia. 

Viva a Liberdade!

25 de Abril Sempre!

Fascismo, nunca mais!