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Discurso Sessão Solene do 25 de Abril

Neste ano de exceção, devido à COVID-19, a habitual Sessão Solene da Assembleia Municipal de Torres Vedras, é substituida por discursos gravados, das diversas forças políticas representadas.
Apresentamos aqui, o discurso alusivo ao 25 de Abril de 2020, do João Rodrigues, Deputado Municipal pelo Bloco de Esquerda.

Podes ver o video aqui: http://bit.ly/3eS8Xa7

TEXTO INTEGRAL

Intervenção Sessão Solene de 25 de Abril de 2020

Decorridos 46 anos da revolução, o 25 de Abril tem hoje um sabor diferente.
Tem o sabor marcado pela falta de liberdade, pela suspensão de direitos, tais como os de circulação, de reunião, de resistência e de desobediência cívica.
Nos últimos dias, a bem da vida e da mitigação dos danos provocados pela COVID-19, fomos obrigados a prescindir de algumas das nossas liberdades, ainda que de forma provisória e é bom que esta palavra não seja esquecida por ninguém – Provisória!
Bem sabemos que o dia da liberdade se festeja nas ruas, mas este ano tem de ser diferente. Esta pandemia e as medidas que foram decretadas para minimizar os seus efeitos, são um teste a todos nós.
Um teste à nossa solidariedade união e sentido de responsabilidade. Não está apenas em causa a nossa saúde, mas o mal que podemos fazer à saúde de outros.
O Bloco cá está, para continuar a luta pelos valores de abril, agora mais que nunca!
Mais do que nunca, importa honrar e defender esses valores que conquistámos.
Nunca, em nenhum momento, seja pelo comum dos cidadãos, seja pelos atores políticos, seja pelas forças de segurança, podemos esquecer ou retroceder no que conquistámos.
Uma das nossas maiores conquistas do pós 25 de Abril, foi o Serviço Nacional de Saúde.
O Serviço Nacional de Saúde veio garantir cuidados de saúde gratuitos e universais, passando a saúde a ser, efetivamente, um direito.
Ninguém neste país, da direita à esquerda do espectro político, sentiu tanto o quão ele é necessário, como agora.
Mas sabemos que o Serviço Nacional de Saúde passa por momentos difíceis e que já estava fragilizado há muito tempo, com falta de recursos humanos e materiais devido a uma suborçamentação crónica e sangria dos recursos para o setor privado.
Tudo por uma opção ideológica que, a partir dos anos 90, o foi desconsiderando a favor das empresas privadas de gestão de doenças e que, como se tem visto desde as fases iniciais desta pandemia, tem sacudido as suas responsabilidades humanitárias, estando em alguns casos, numa dita “parceria” com o Serviço Nacional de Saúde mas… A que preço?
Outras empresas de gestão de doenças, optaram simplesmente por encerrar portas, descartando os seus utentes para o já fragilizado e hiper carenciado Serviço Nacional de Saúde. Veja-se o SAMs, a Trofa Saúde e outros que não estando encerrados, se recusam a receber utentes ao mínimo sintoma compatível com a COVID-19.
Ora, se esta crise de saúde pública nos prova alguma coisa, é a necessidade de um serviço de saúde público e universal.
Até mesmo aqueles que sempre defenderam os interesses dos grupos privados da saúde, agora, vieram exigir ao Serviço Nacional de Saúde.
Quando a crise chega, exige-se tudo ao Serviço Nacional de Saúde e ele cá está, ao contrário de inúmeros privados que se refugiam desta crise epidemiológica.
Mas a, agora, evidente necessidade de mais Serviço Nacional de Saúde, não é a única evidência da necessidade de mais Estado.
Grupos políticos da ala neoliberal vêm todos pedir ao Estado!
Partidos de direita, gestores e administradores de empresas, das que sofrem dificuldades financeiras, mas também das que têm saúde financeira para suportar esta crise, todos vêm pedir ao Estado.
Os que apelidavam a esquerda de subsidio dependente e de defender a interferência do Estado na economia, todos, sem exceção, vêm pedir subsídios e outras formas de ajuda ao Estado.
A Pandemia, suspendeu as doutrinas de direita, de liberalização e autorregulação de mercados.

O liberalismo funciona… desde que não existam crises onde, depois, só um Estado forte poderá mitigar.
Mas ainda assim, não param os abusos.
Existem empresas neste país que a bem da sua responsabilidade social e tendo em conta a sua situação financeira, têm estabilidade suficiente para aguentar os seus postos de trabalho por alguns meses sem faturação.
Mas também essas, na sua maioria, utilizaram o layoff para pôr o Estado a pagar parte dos vencimentos dos seus trabalhadores.
Ainda assim, nesta situação de emergência financeira e social, não abdicam de um cêntimo daquilo que se julgam no direito de obter.
A pandemia passará e tal como o COVID-19, o vírus do neoliberalismo regressará em força.

Virá uma recessão.
Esperemos que quando essa altura chegar, o mesmo consenso que existe agora no Parlamento, a bem da melhor gestão desta crise se mantenha na altura de defender os interesses da população em geral e que, à semelhança de 2011, não se faça com que a percentagem mais frágil da população, tenha a seus ombros o pagamento de uma crise.
Não contarão com o Bloco de Esquerda para defender austeridade! Esta deu provas e mais provas de não ser o caminho certo, na última crise financeira que tivemos.
Contarão sim, com o Bloco de Esquerda para defender agora e sempre, os interesses dos trabalhadores, das famílias e dos mais desfavorecidos e para fiscalizar em permanência as medidas de exceção deste continuado Estado de Emergência, para que sejam mesmo exceção, aplicadas na medida correta, limitadas no tempo e levantadas logo que a saúde pública o permita.
No âmbito do poder local e nestes tempos tão diferentes, que exigem medidas excecionais, são também tempos para refletir sobre a importância das instituições de poder de proximidade, fundamentais pela função social que desempenham e pelo seu papel na unidade territorial, no combate às desigualdades e desequilíbrios, aproximando aglomerados urbanos e espaços rurais.
É nesse papel de promoção da coesão e construção de um concelho melhor e mais justo, que urge olhar para a autarquia e projetar os valores de Abril também no exercício do poder local, especialmente nos tempos difíceis que se avizinham.
Um poder local que esteja próximo das populações, na satisfação dos seus direitos básicos e anseios, promovendo a participação de todos na vida e nas decisões da comunidade; e não um governança pautada pela manutenção do poder pelo poder, ao serviço de interesses partidários e clientelismo;
Um governo autárquico que se preocupa com o combate às assimetrias e com os indicadores de inclusão e coesão social e não com os metros de betão que espalha;
Uma autarquia que promova e apoie políticas integradas de sustentabilidade ambiental, em vez de se satisfazer com obras casuísticas de fachada;
Uma política local fundada em valores e transparência, com verdadeiro sentido de serviço público e não como um modo de vida;
Um poder local presente e que dê a cara, especialmente nos piores momentos. Que fale olhos nos olhos com os cidadãos, especialmente os que mais precisam; e que não apareça apenas nos eventos que promovam um bom “marketing” eleitoral;
Um poder autárquico de gestão democrática e participativa, que abrace a diversidade de ideias como uma riqueza e não como ameaça à manutenção de um poder hegemónico.
Uma autarquia que promova os relacionamentos intergeracionais, que recolha as ideias dos mais novos, mas que não descarte a experiência dos mais velhos. Foram os mais velhos que nos trouxeram até aqui e tudo lhes devemos.
EM SUMA: Um poder local de abril, na diversidade das ideias e na representatividade democrática, onde o Bloco de Esquerda de Torres Vedras orgulhosamente se enquadra e aqui se afirma como alternativa.
Hoje, e nos últimos 46 anos, nunca fez tanto sentido gritar: Viva o 25 de Abril!